Le Editorial * 363 por Rafa

Amor ao Tejo

O Ricardo Filho de Josefina apanhou-nos enquanto seguíamos o ruminar do Tejo no seu leito, de cana na mão. Um belo instante de gente de rio. Até porque Lisboa sendo uma cidade de mar, será sempre e mais de rio. Miguel , Fauna Maria e  Rafa.El , pescadores de sonhos, não usam godo nem engodo, nem sequer isca ou anzol. Têm na ponta da haste da cana um pedaço de pão sem espigão e em espera.  

Dão-no de comer assim, toma-lá-que-já-almoçaste, ao peixe que passa na passa. Um dia talvez lhe chegue a tainha que agradeça, saciada.

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* Originalmente publicada a 25 de Outubro de 2012, na Le Cool Lisboa * 363

Le Artista da Capa * 363, Ricardo Filho de Josefina

Amor ao Tejo

quero-te entre tanto que não passa, mas traça e amassa.
o pequeno lince finge deitado e amordaçado, ao sol é dourado.
o que vai não fica esmurrado como a maior parte que não parte.
nem sequer olhei para o relógio e ainda não é meia noite.
foram quatro dias em tão pouco tempo em que nada fiz,
pelo tamanho era aquilo e dentro de pouco o habitual.
língua sem tento morde os dentes,
cala as vozes de quem com dentes nem as nozes devora e engole vento.
ao largo passa o barco enquanto o medo caminha ao relento.

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Foto: fome de rouca, dura


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* Originalmente publicado a 25 de Outubro de 2012, na Le Cool Lisboa * 363

Le Capa * 363

por Ricardo Filho de Josefina

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* Originalmente publicado a 25 de Outubro de 2012, na Le Cool Lisboa * 363

Le Entrevista a Pedro Chagas Freitas por João Freire


Boa tarde. Fala-me um pouco do teu percurso e da tua evolução enquanto escritor. Não enquanto profissional, mas o que te levou a fazer o que fazer agora enquanto ser social.

O meu percurso enquanto escritor confunde-se com o meu percurso enquanto pessoa. Escrever, segundo a minha filosofia, é pensar. Desde que me lembro de ser pessoa que sou escrevente. E fui crescendo em paralelo – enquanto escritor e enquanto pessoa. Escrevo porque é, até ao momento, aquilo que vejo que sou capaz de fazer melhor. Escrever e ajudar a melhorar a escrita dos outros preenche-me bastante – embora comece, cada vez mais, a abrir novas áreas de trabalho, como a de orador, por exemplo. Mas bem vistas as coisas não há grandes diferenças entre um e outro. No fundo, o orador faz aquilo que o escritor faz: obriga quem está do outro lado a pensar. E é isso que eu adoro fazer. Pensar é um prazer do caraças.

Le Crónica ao OUT.FEST 2012 por Hugo Strawn | Fotografia por Rula Domínguez

Quinta-feira à noite no Barreiro: pouco movimento nas ruas.

21h, 21h30. A cidade gosta de se pensar como de trabalho, apesar da falta de dinheiro, da desindustrialização, da suburbanização estilo dormitório. A cidade tem um modo peculiar de viver as mudanças. O Teatro Municipal do Barreiro fica num centro comercial onde quase todos os espaços comerciais não funcionam enquanto tal... ARRENDA-SE. O auditório onde decorreu o segundo concerto agendado do OUT.FEST 2012 encheu.

Helena Espvall surgiu em palco com um colorido vestido. Trabalhou o violoncelo a solo, tocado através de loopers e pedais de efeitos e construindo uma atuação baseada numa improvisação melódica e algo, por assim dizer, telúrica. Prelúdio para o que seguiria.

Steve Gunn tem vindo a delinear e ofereceu no Barreiro um fascinante trajeto/ação assente numa guitarra na tradição da americana e da vagabundagem numa colocação de voz de assombração. Uma canção sobre um homem que busca/buscava coisas no lixo. Sons como pura presença, paus espetados na terra. Not the Spaces You Know, But Between Them. Com o homem do Brooklyn percebemos, então, isso de musica exploratória e como o OUT.FEST brinda quem dele se aproxima com os melhores momentos musicais do ano e a cada ano. O final do concerto foi uma colaboração entre Espvall e Gunn. Aliás, o final foram os aplausos e como os músicos se retiraram modestamente depois de terminado o seu trabalho. Nem encores, nem braços no ar, nem gritos. A intuição de inteligência prossegue.

Hipóteses de reconciliação com a cidade.

Sexta-feira à noite numa outra zona da cidade do Barreiro: mais movimento nas ruas do que no dia anterior.

21h30, 22h. Será possível na realidade portuguesa uma vida citadina diferente da formatação sair de casa centro comercial/copos/delinquência e pouco mais? Caminhar por passeios europeus... A igreja do Convento da Madre de Deus da Verderena (que necessita de renovada pintura exterior) encheu. Algumas dezenas de pessoas. Musica exploratória. Os membros da associação OUT.RA (Rui Pedro Dâmaso, Tiago Sousa etc.) andam sempre por ali e o festival funciona, simpático e com intenção. A antiga igreja do convento, na penumbra, recebeu o público.

Helm, aliás, Luke Younger, abordou, em linguagens noise e espectrais, um peculiar conceito de ordem: massa sonora, dissidências, prevalência da dissidência, uma segunda dissidência (massa rítmica), combate, um terceiro elemento, prevalência do terceiro elemento (massa/ordem), transmutação, final cavo.  

Kevin Drumm voltou a encher a igreja. Os Yong Yong montaram a tenda e o sistema de som no claustro. Lá fora as ruas esvaziavam-se.

O rigor do «silêncio» ainda é possível.

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* Originalmente publicado a 18 de Outubro de 2012, na Le Cool Lisboa * 362

Le Entrevista a Bruno Simões (Phantasticus) por El Rafa


Gostava que te apresentasses pessoalmente e falasses da tua relação com o Phantasticus!

Sou sócio gerente da produtora de eventos Free Music, entidade promotora deste festival.

Já de si é fantástico que exista tão boa proposta fora do eixo centro-cidade. Gostava que desenvolvesses isto, a da vida cultural fora do polo Lisboa, um pouco mais. Sem deixar de fora frustrações e ambições. Querem servir de contraponto a um Fantasporto no Sul ou a um MOTELx na outra margem ou a comparação é nonsense? O Phantasticus! quer ser e é um Festival do fantástico ou tem mais dentro dele?


Almada, embora seja uma cidade que se encontra bastante próxima de Lisboa, tem uma vida cultural muito própria, desconhecida pela maioria das pessoas.

Le Editorial * 362 por Rafa

Pluvia

O Miguel , a Fauna Maria e o Rafa.El sentam-se frente a frente num bar e repetem a cena inicial do Reservoir Dogs. O tema não é a gorja, que tuga que é tuga a se engraçar com o dito empregado/a. Nem sequer se comenta se a Madonna é virgem pela décima quinta vez. A conversa é mesmo sobre a chuva, o que levanta considerações que encontram reflexo na expressão de cada um. E cada qual cimenta as suas razões. A Fauna Maria gosta de cantarolar na chuva e queimou velas o verão todo para que chegasse menos de fininho. O Miguel é surfista e isto até que o chateia, . o Rafa, que não conhece o objeto referido como guarda-chuva e é feito de açúcar, prefere ambientes tipo La Havana. A ver vamos, que o outono ainda vai a meio e Lisboa tem calçadas que fazem os cus escorregar.

Le Artista da Capa * 362, Maria Bouza Pinto

Chamo-me Maria, tenho 28 anos... e na verdade não gosto muito de falar sobre mim...

Quando era pequenina (e continuo a ser, mas um bocadinho menos) gostava de desenhar casas e queria ser arquitecta como o meu pai... No entanto a vida trocou-me as voltas e foram os imensos livros infantis que a minha mãe colecciona e do qual sempre estive rodeada que me trouxeram até aqui. 

Cheguei a passar pela faculdade de arquitectura, mas ao fim de uns anos e desgostosa com o curso fiz as malas e mudei-me para Barcelona. Trabalhei em bares (aproveitava para desenhar nos guardanapos), numa loja ( desenhava as pessoas que passavam na rua), num museu de zoologia (desenhava os animais, coitados... embalsamados), call-center (aqui não dava mesmo para desenhar), traduções (nem aqui)... e estudei ilustração!!  

Desde
2006 tenho vindo a trabalhar como freelancer tanto para Espanha como para Portugal. Depois de cinco anos e meio regressei a Lisboa em abril e às vezes ainda falo «portinhol». 


Podem encontrar-me aqui e aqui.

Lisboa é um grande amor, mas farto-me de zangar com ela. como com (quase) todos os grandes amores. 

Obrigada :)

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* Originalmente publicada a 18 de Outubro de 2010, na Le Cool Lisboa * 362

Le Capa * 362

por Maria Bouza Pinto

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* Originalmente publicada a 18 de Outubro de 2012, na Le Cool Lisboa * 362

Le Capa * 361

por Sara Osório

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* Originalmente publicada a 11 de Outubro de 2012, na Le Cool Lisboa * 361

Le Entrevista a Pedro Tavares por Rafa


Fala-me de ti e não me omitas nada. 

Nasci em Lisboa, na MAC [Maternidade Alfredo da Costa], em 1968, após aquele maio louco. Estudei pouco, mas em muitos sítios, e ainda assim um pouco de tudo. No ARCO estive por duas ocasiões, onde aprendi umas coisas e desenvolvi algumas técnicas plásticas. Estive ainda uns tempos a estudar Direito na Universidade Lusíada, mas foi em Barcelona que me encontrei. Na capital da Catalunha, de 2004 a 2008, vivi e estudei finalmente alguma coisa na Elisava Escola Disseny. Atualmente, sou designer gráfico freelancer e colaborador da Le Cool Lisboa, da Rua de Baixo e da DIFMagazine.

Além da tua brilhante prestação na Le Cool, que outras andanças me contas?

Mentais e terrenas, muitas! Tenho alguns projetos na cabeça que gostava de colocar em prática, mas ainda é cedo para falar neles. Escrevo para outros lados, como já referi e ainda ando metido na serigrafia têxtil. Chega?

Le Artista da Capa * 361, Sara Osório

O meu nome é Sara Osório e três anos (precisamente) fiz duas capas Lecool (aqui e aqui), também elas dedicadas ao nosso querido mês de Outono (também o podemos acarinhar, ).

Desde então, continuo a pertencer à parcela de licenciados que, após passar vários anos a projectar cenários perfeitos, acaba a trabalhar numa área que nada tem a ver com as suas qualificações, mas luta para manter o lado criativo (pelo menos, nos tempos livres).
Foi com esta luta, que me tornei designer e ilustradora freelancer a meio-gás, tendo o meu último projecto sido a ilustração do livro «Palhincócegas», de Alexandre Honrado, publicado pela Editora Planeta Júnior e que foi considerado um dos 100 melhores livros europeus para crianças, pela revista La Revue des livres pour enfants, e teve também um destaque, na Feira de Bolonha de 2012, como um dos 150 melhores livros Portugueses.
 
Recentemente, desenvolvi o meu projecto sara-a-dias, um blog que actualizo diariamente e que procura partilhar histórias (que, por certo, acontecerão com outras tantas pessoas). O nome surge, não , porque o meu último apelido é "dias" (apesar de não o usar), mas também porque me tornei numa "mulher-a-dias" que gosta de "polir" o quotidiano que me rodeia. No entanto, ao mesmo tempo, é um dedo que aponto para pormenores alheios.

Dia sim, dia não. À hora ou ao minuto. São apontamentos de um quotidiano.
Para visitar aqui e aqui.

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* Originalmente publicada a 11 de Outubro de 2012, na Le Cool Lisboa * 361

Le Editorial * 361 por Rafa

Hinterland

O Miguel , a Fauna Maria e o Rafa.El acham-se no direito de te perguntar. Que conheces além do centro de Lisboa? Fora do centro histórico de Alfama-Castelo, ou do eixo da moda da Avenida-Chiado, da zona financeira do Marquês-Saldanha e do epicentro político de São Bento-Comércio, que partilhas de espaços e de momentos do hinterland lisboeta? um miradouro em Penha de França longe dos eixos turísticos. Um fondue chinês no Chile que faz perder qualquer restaurante de chāu-mèing. Uma vista irrecusável sobre o rio, numa capela, numa colina, no Restelo. E que mais desta Lisboa fora do postal, te salta em saliva da boca?

Le Capa * 360


Por Rafa

U Chiado Trendy Bar-Restaurante

Foi inaugurado na noite da Lisboa Fashion’s Night Out e promete ser uma das grandes atrações da movida noturna lisboeta. Além de localizado em pleno coração do Chiado, está rodeado de vida artística e cultural tendo como vizinhos dois dos principais teatros da cidade. Possui 2 pisos e um pequeno pátio onde se pode desfrutar de refeições num clima mais intimista e quiçá romântico.

A cereja no topo do bolo é o bar sofisticado com decoração industrial chic e uma cozinha de fazer crescer água na boca, assinada pelo Chefe Rui Fernandes. Apresenta um conceito que se pretende inovador e diferente.  

Caxemira

A experiência de chegar é a introdução para aquilo que posso designar como o melhor restaurante indiano da cidade de Lisboa. Nunca dizer 'meter o Rossio na Betesga' fez tanto sentido, e entrando no número 4 da Rua dos Condes de Monsanto, subindo ao primeiro andar direito descobrimos como todo o sabor e tradição da Índia podem existir num espaço tão pequeno e único. À porta a fila amontoa-se e o odor a tandoori domina o estímulo às papilas gustativas.  
Aqui tudo é genuíno e próximo. As mesas convivem entre si e os pratos sabem melhor quando partilhados entre amigos. Nunca os caris foram tão perfumados ou as especiarias tão coloridas. O Caxemira é daqueles restaurantes que se esconde na espera de ser descoberto. / Francisco Pinheiro (Foto daqui)
 

Le Artista da Capa * 360, Rafa

Cicloturista. Ou como fazer a vida toda em bicicleta por Lisboa. A aritmética das rodas é desnecessária, podia correr a vida num monociclo, num triciclo, num tandem ou noutro veículo qualquer motorizado a gémeos e a sartórios. E Lisboa surge aqui porque é aqui que estou aqui. E o velocípede fica sempre tão bem na minha paisagem.
 
Eu dispenso o casco, mas não ponho de lado os constantes prémios de montanha a cada uma das colinas. Sabe-me bem. E o chegar ao topo de algo não implica o içar de bandeira, mas é cometimento que arreda meia mensalidade em ginásios. Precisas de ir ao centro e ao mercado, ao café do bairro e à manif da semana? Bicicla-te! Eu acometo a ir de rodas para o trabalho, dez quilómetros em Lisboa é (atenção, que aqui assino manifesto) camisola amarela ao ambiente, à carteira e à saúde. Palavra de ciclomobilizado.
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A Capa é um momento de fim de tarde captado ao longo da ciclopista que se amarrou à beira do Tejo, Lisboa.
 
Imagem de Rafa por L.

Le Editorial * 360 por Rafa

Lisbonauta

O Miguel , a Fauna Maria e o Rafa.El perguntam porque se chama de "indianos" às lojas que afinal são de paquistaneses e onde até se fala italiano? Era Mussolini de Karachi ou o foi o farfalle primeiramente moldado em Islamabad? E mais, para quando um Povinho na Rua de São Bento ao jeito do Manneken Pis? Olhando de braços cruzados e daquele jeito tão carinhoso, a malta do antigo mosteiro de São Bento da Saúde? São assim coisas que nos assolam, tal como quando é que será que o póquer reconhecida a sua implantação lusa e se torna desporto-rei nacional.