Le Entrevista a João Santos por Lino Palmeiro


Quando se escreve num teclado sem cedilha nem til, adensam-se as recordações da Pátria, a língua portuguesa? Era uma boa questão, mas não a fizemos. Nada que o João Santos, fotógrafo-viajante-terapeuta-português e tudo, não esteja habituado a resolver. De momento, está em Adelboden (Alpes Suícos) e foi uma conversa a teclar de cá e de lá.

Biografa-te daí um pouco. Querias ser fotógrafo desde menino?

Quando nasci já trazia o "desenho" no dedo e um olhar curioso. Sempre vi o mundo de forma diferente, mas nunca de frente.


Perspetivas... Desenhei muito, mas com o tempo os lápis ficaram na gaveta (mas o traço nunca se perdeu). Depois foi o olhar que se apurou e amadureceu com a vida. A arte era para mim como um terreno fértil - sentia a vontade de experimentar/cultivar um pouco de tudo (desenho, pintura, escrita, cinema, e o gosto pela música erudita). Não iria ser fácil, havia uma batalha enorme dentro de mim - estava tudo por domar e, principalmente, cru e sem expressão. Passei pelas Letras porque sabia que queria escrever, mas não terminei. Mais tarde saltei para o Cinema - também não concluí, e ainda passei rapidamente pela Sociedade Nacional de Belas-Artes (reminiscências de querer desenhar e pintar). Só com tempo é que o turbilhão abranda - e as ideias tornam-se mais claras também.

O meu gosto pela música erudita ganha então forma e expressão. Nos anos 90 tive um programa de rádio na mítica xfm (Sinfonia). Mais recentemente (em 2009), voltei a ter uma breve incursão na rádio - na Antena 2 (Atlas - programa trimestral). A fotografia veio apaziguar o dito turbilhão. O que aprendera na Escola de Cinema serviu-me de base para poder começar a expressar tudo aquilo que eu "via" e "sentia". A máquina era o prolongamento do meu cárebro - um novo braço que interagia com a realidade. A mão sempre foi mais forte e queria também "falar" - tornei-me terapeuta.

Fala-nos dos teus projetos profissionais e das tuas andanças pelo mundo. E junta-lhe uns links.

Comecei a viajar pelo mundo e a trabalhar como massagista-terapeuta. As viagens levaram-me aos quatro cantos do mundo e abençoaram-me com novos sentidos, formas, cores, cheiros e gentes. Tudo me invadia com um fascínio transcendente. Conseguira pela primeira vez conciliar uma profissão com a minha expressão artística.

Os estímulos acabariam inevitavelmente por tomar um corpo - a Fotografia! Foi no Dubai que se deu a viragem com os meus trabalhos CityLights e Signs (ambos Art Base Selection pelo rhizome.org no Novo Museu, NY). Tudo se aprende, mas é a experiência que nos apura os sentidos. Foram estas viagens (ausências) que me trouxeram um sentido crítico e a disciplina para o meu olhar.

Hoje em dia estou representado pelas galerias Art Lounge (Lisboa) e The Jam Jar (Dubai), alem das representações online na Immaterial Lisbon (Lisboa) e na Art Traffik (Facebook). Os meus trabalhos fotográficos foram publicados em revistas no estrangeiro, tive exposições individuais e participei em diversos eventos coletivos.

Projetos que se afiguram: intervenção num hotel em Lisboa (em breve), mais uma participação num evente coletivo na Florida, em Naples (janeiro de 2013) e um artigo numa revista estrangeira. A gratificação passa inegavelmente por todos estes veiculos de exposicão e que permitem o feedback - a interação com a minha "fala visual".

Porque no fruir da Arte tudo se resume na questão da "Autopsicografia" de Fernando Pessoa: "e logo o que os outros veem, ja não é tanto o que eu inicialmente vi, e sim mais aquilo que eles veem de mim".

E Lisboa é o quê? O que é que Lisboa tem? Sugere aí um dia perfeito pela cidade.

Lisboa é inefável! Parafraseando Jorge de Sena: "Inefável é o que não pode ser dito". Lisboa dos jardins quase secretos: descobrir o Dragoeiro no Parque Monteiro-Mor, ou curvar ao meio o Vale do Silêncio, nos Olivais; a Fonte das Quarenta Bicas no Jardim Botânico da Ajuda e o Jardim do Torel, debruçado sobre a Avenida. Os passeios à beira-Tejo, claro.

E sempre Alfama, a subir a encosta das Portas do Sol. A Mouraria adormecida; Rua da Palma Chinatown mesclada com a Índia, até ao quarteirão dos Anjos. Ou descer a Avenida Prada Vuitton Herrera e Ca., entrar pelas Portas de Santo Antão e terminar no "Mercado Africano" junto ao Palácio da Independência. Tudo isto e muito mais. Nesta cidade crescida ao Sol e lavada no Rio. Cidade antiga, fenícia, romana e moçárabe. De toda a gente... na presença e na ausência.

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