Cinema Documental. Uma das minhas paixões. E Cuzco, outra.
Desde
que comecei a viver aqui e me consciencializei da realidade e da
necessidade constante nesta cidade com tanto contraste social, que a
vontade de produzir um documentário surgiu naturalmente. A oposição
entre o turismo e as vidas deixadas ao abandono, com a vertente
histórica, sem um acesso às condições básicas de vida deixa-me
revoltada. É complicado explicá-lo em poucas palavras. O mundo precisa
de saber o que se passa, num dos países mais ricos em recursos naturais e
mais forte culturalmente na América do Sul.
Nos meus
últimos dias em Lima encontrei um curso de cinema documental organizado
por DOCUPERU, uma das organizacoes mais importantes no mundo dos
documentários no Peru. E como nada se passa por acaso nesta vida,
compreendi que isto seria um sinal. Inscrevi-me, voltei a Cuzco para de
uma vez por todas deixar o meu apartamento e o meu trabalho no hostel, e
voltei a Lima.
Nessa semana em Cuzco, vou a Urubamba
visitar Celestino. Aproveito e vou com alguns voluntários distribuir
roupas para as famílias. Celestino convida-me para almoçar. E nesse dia
em vez do comum “Choclo con queso” que nos dão, levou-me a um
restaurante. Era a minha prenda de aniversário. O almoço foi bastante
simples, um Caldo de Galinha e Chicha. E Celestino disse-me : “Querida
Joanita, desculpa-me que seja uma prenda tão simples, sei que querias
experimentar um “Cuy” (Porco da Índia assado - prato tipico cusqueño),
mas financeiramente não posso dar-te esse privilégio.“ A única coisa
que podia pensar era que este homem não existe.
O meu
desejo de ir para a frente com o projecto de Urubamba mantém-se. E nao
quero ter que desistir. Não posso olhar Celestino nos olhos e dizer que
desisto. Não posso e não quero. Vou até onde me esgotarem as forças e as
oportunidades.
De volta a Lima, em Barranco. O bairro
boémio de Lima. E o mais pitoresco. Os dias continuam cinzentos e
húmidos como em qualquer Inverno na Costa. Apenas chuvisca, porque na
verdade não chove em Lima há quase mais de cem anos. As casas e os
autocarros têm cores vivas e curiosamente são quase todos verde,
vermelho e amarelo. Ao final do dia sabe sempre bem beber um Chilcano
(bebida tradicional peruana com pisco e Ginger Ale) acompanhado com um
Piqueo de azeitonas com pimentos, ao som dos “cajoneros” .
Gosto
de levar o meu computador e escrever na companhia de senhores de meia
idade que matam o tempo nestas bodegas. A Bajada de Baños é uma calçada
que desce até à praia preenchida de ambos os lados com marisqueiras e há
sempre alguém com uma viola a tocar clássicos peruanos. Chabuca Granda.
Uma famosa cantora peruana, barranquinha de “gema“, recorda-me os
clássicos de fado na velha Mouraria. E como sabe bem escutá-la, na voz
de algum cantor amador, e comer um ceviche acompanhado de um vinho
branco bem fresquinho.
Com vista para a Bajada está a
Puente de Los Suspiros, a ponte romântica de Barranco. Era onde no
início do século, as senhoras de classe alta se passeavam nos seus
melhores vestidos. Tantos corações se derreteram nesta ponte, que
acabaram por lhe dar esse nome. Contam que quem atravessa esta ponte
pela primeira vez sem respirar, e pedindo um desejo, ele acabará por se
realizar.
Pode-se caminhar por toda a baía de Lima nos
seus 20 km de costa. Por onde se caminha chamam de “malecón”. Ao final
da tarde passeio um pouco para ver o pôr-do-sol e respirar a brisa do
mar. Por todo o Malecón há palmeiras e parques onde se sentam os casais
na relva a namorar. Os vendedores de gelados passeiam toda a baía
tranquilamente na sua bicicleta. Os dias são preenchidos entre muito
café, cigarros, documentários e continuar a luta por Urubamba. Mesmo
assim, nao posso esperar por voltar a Cuzco.
Links
Joana Vitória Martins, Cuzco Junho de 2011
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