Le Entrevista aos TV Rural por João Freire


















Os TV Rural apresentaram dia 12 de maio o seu mais recente trabalho, intitulado "Balada de um Coiote". Para quem esteve foi um ótimo concerto, mostrando porque os TV Rural são de momento uma das mais cativantes bandas portuguesas. Cantam em português, misturando elementos tão distintos como um rock musculado e bem delineado, com elementos "jazzísticos" e quase de improviso. São canções instrumentalmente já bastante poderosas, o que aliado à grande qualidade das letras transforma cada uma delas em algo muito viciante.

David Jacinto - DJ
David Santos - DS
Gonçalo Ferreira - GF



Bom dia. Como se sentem depois deste fim de semana de celebração? Foram bem acolhidos no Musicbox? Conta-me resumidamente como correu o concerto.

DJ:  O concerto de apresentação do disco no Musicbox não podia ter corrido melhor! Estava tudo cheio de vontade de curtir e foi isso que aconteceu: uma grande festa. Os Feromona fizeram a primeira parte, deram um grande concerto e aqueceram bem o público… depois fomos nós, e foi só questão de manter os ânimos onde se queria: bem elevados. Para nós foi muito emocionante, pois estas datas são sempre especiais. Penso que o balanço foi muito positivo, demos um grande concerto e tivemos a oportunidade de dar a conhecer o nosso novo disco “A balada do Coiote”. Aliás quem entrou levou para casa um exemplar do disco.

De onde surgiu o vosso nome?

DJ: TV Rural era o nome de um programa que dava na televisão quando éramos putos. Faz parte do nosso imaginário coletivo. Quando decidimos dar um nome a esta banda, optámos por TV Rural, que embora não sendo um nome extraordinário, é um nome que não deixa ninguém indiferente. Quem ouve pela primeira vez o nome TV Rural associado a uma banda rock, não grama e estranha. Mas também não esquece! Nesse sentido funciona.

DS: O nome TV Rural representa também aquilo que pretendiamos que fosse a música da banda: rock cantado em português com uma forte identidade. Não queríamos ser a versão portuguesa de uma qualquer banda estrangeira. A estranheza deste nome associado a uma banda rock vs a familiaridade graças ao programa homónimo de certa forma passa uma ideia de singularidade. Para além disso representa uma espécie de dicotomia entre algo que aponta para o futuro, o que está na moda, que é citadino, tem "hype" e passa na "TV", e uma forte influência da tradição da canção portuguesa quer fosse do Jorge Palma, Sérgio Godinho, Fausto, Zeca Afonso ou dos cantares tradicionais típicos dos meios rurais. Penso que foi neste caldeirão que a nossa música começou a ser cozinhada.

Como surgiu inicialmente o projeto, o que vos levou a gravar o 1º disco, e o que vos levou a só gravarem o 2º tanto tempo depois?

DJ: Convém perceber que nunca profissionalizámos esta banda. Naturalmente que levamos isto muito a sério, mas nunca ao longo destes mais de dez anos juntos, optámos por fazer deste projeto o nosso ganha pão. Talvez seja esta a razão da longevidade dos TV Rural. De modo que o tempo aqui é altamente relativo. E daí que surjam este tipo de perguntas. Se para muitos a ideia de levar mais que 4 anos para gravar um novo disco, seja absurda, para nós esse problema não se põe. As coisas demoram o tempo que for necessário. Não temos compromissos com ninguém, nem há qualquer tipo de pressão, nem lógica de mercado associado à nossa música. Fazemos o que nos dá gozo, temos total controlo naquilo que fazemos e lançamos discos quando nos é possível. Somos nós que produzimos o nosso trabalho, e o investimento é todo nosso. Se demora mais ou menos tempo... o problema é nosso.

Começámos a tocar como TV Rural em 2000. Até 2007, altura em que gravámos o “Filomena Grita!”, gravámos uma série de EP e maquetas, e tocámos bastante ao vivo. “A balada do Coiote” que saiu esta semana (pela Chifre) é o resultado de um longo tempo de fermentação. Era preciso apurar algumas canções antes de as pôr em disco.

Que andaram a fazer durante esse tempo?

DJ: Estivemos em pré-produção do disco.
DS: Convém no entanto ter em conta que para os TV Rural o tempo passa de maneira diferente...

O que mudou no panorama da música portuguesa nestes anos todos? Acham que está mais favorável para as bandas cantarem em português?

DJ: Tanto as bandas como o público em geral, estão mais receptivos e abertos ao rock cantado em português. Quando começámos eram poucas as bandas (de garagem) que se lançavam ao desafio. Hoje em dia é mais frequente. Há mais música independente a aparecer e a ter visibilidade, e muita dessa malta canta em português. A verdade é que cada vez mais se ouve boa música em português, mas também há muita merda. Mas sinceramente, mais vale rock merdoso cantado em português do que num inglês mal amanhado.

GF: Sobretudo acho que há mais música, faz-se mais e ela chega mais facilmente às pessoas, os meios que hoje existem ajudam e também são mais dados a coisa novas, é mais fácil arriscar e fazer aquilo que queremos sem compromissos ou ambições, ser-se mais espontâneo e descomprometido. O cantar em português (e ouvir português) vem por arrasto. Nós gostamos de descomprimir em português, não há como um belo “dass” para rematar uma frase...

Conta-me um pouco da história por detrás deste disco... Como foi escrito, como foi pensado, gravado etc.

DS: Este disco começou a ser pensado em 2008 pouco tempo depois de termos editado o Filomena Grita!. A primeira ideia era gravar um EP em que houvesse uma maior proximidade estética entre músicas, algo que os TV Rural sempre descuraram. À data existiam já umas canções na calha e achávamos que tinham o perfil adequado para ser esse disco. Entretanto o tempo foi passando, mais músicas foram surgindo e quando demos conta aquilo que era para ser um EP a lançar pouco tempo depois do Filomena passou a ser um LP lançado 5 anos depois.

Tentámos ainda assim não perder a ideia original de haver maior homogeneidade nas canções e que estas se relacionassem com ambientes noturnos e de certa forma introspetivos. A capa do disco, feita pelo Eduardo Viana, tenta também passar esta ideia. O processo de gravação e mistura foi atribulado, cheio de percalços e acidentes. Depois de muitas "coboiadas" acabou por ser gravado no Golden Pony com o Bernardo Barata e o Pedro Magalhães e misturado pelo Tiago de Sousa que também masterizou o disco com a ajuda do Pedro Cruz.

Teve alguma influência mudarem de editora entretanto?

DS: Não sei. As editoras a que nos associámos sempre foram coisas pequenas e que no fundo eram apenas nós, as bandas envolvidas, e podiam ser tudo aquilo que quiséssemos que fossem. Acabaram por nunca ser nada! A Catadupa! era um grupo de amigos com objetivos semelhantes que compreenderam que era mais fácil chegar às pessoas e "furar" por entre os media se o fizessem em conjunto. Foi com este selo que acabaram por sair o primeiro disco dos TV Rural, o primeiro dos Feromona e um disco do José Castro mas pouco mais aconteceu para além disso. Anteriormente já tínhamos tentado o mesmo com uma coisa chamada Projecto Sonda mas que não deu em nada com a exceção de uns concertos na FNAC para apresentar o projeto.

A Chifre é de certa forma um "virar a página". Não deixando de ser uma editora caseira, tem muita vontade de fazer coisas e um espírito altamente. Somos uma família. A grande vantagem da Chifre em relação aos outros projetos de editoras que tivemos é que o pessoal da Chifre não tem bandas, trabalha para elas e faz aquele trabalho que tem de ser feito mas não por quem toca.

DJ: O trabalho com a Chifre tem sido impecável e altamente complementar... eu diria que a Chifre é uma pequena grande editora, e como nós, é do rock \m/. Se tudo correr como tem corrido até agora, estou certo que iremos lançar muitos discos pela Chifre.

Quais os planos agora? Alguma digressão de apresentação do disco?

DJ: A ideia é mostrar este disco ao maior número de pessoas possível. Se isso passar por uma digressão, tanto melhor. Tocar ao vivo dá-nos um gozo tremendo! Mas por enquanto as propostas não são muitas.  No entanto estamos confiantes que isto vai dar uma pequena volta. Estamos muito contentes com o resultado do disco e o feedback por parte de quem já o ouviu tem sido bastante positivo, por outro lado os nossos concertos são muito intensos e o público reage bastante bem,  de modo que gostamos de acreditar que iremos ser mais solicitados daqui para a frente. A ver vamos... uma coisa é certa: estamos prontos para mais uma década de rock!

Por último, qual a saída para este sentimento de descrédito da sociedade portuguesa?

DJ: O sentimento de descrédito da sociedade portuguesa é para com a classe politica. Se é música que eles nos querem dar, é com música que iremos responder! No nosso caso, será com rock, daquele pujante e em bom português para que nos possamos entender.

GF:  Podia começar por reconhecermos em quem manda, algum valor. Podíamos ver exemplos e isso não acontece, acho que o não acreditar é completamente natural e até obvio. Podemos ser enganado uma ou duas vezes mas à décima nona um gajo desconfia. Mais marés virão. A música é independente e consegue sempre viver bem com ou sem descrédito, ou crédito, como no nosso caso.

Site da banda: http://chifre.org/project/tv-rural

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