Le Entrevista a Julie & the Carjackers por NunoT


Julie & the Carjackers nasce em 2009 da ligação neural de dois cérebros com uma visão da música muito específica. João Correia e Bruno Pernadas, pressente-se, olham para a música através de linhas pautadas. E mesmo que assim não seja fazem-no como se assim fosse. E porquê?, perguntam. Simplesmente porque se percebe que pensam realmente na música que fazem. Pensam-na profundamente. Vão às entranhas de cada pista e instrumento nos seus temas. Vão ao detalhe de cada compasso, de cada linha melódica ou do break rítmico entre a quadra e a ponte que desemboca no refrão. Tudo na sua música faz sentido melódico, harmónico e rítmico. E isto, meus caros, é qualidade na arte de compor e fazer arranjos, que é coisa que o tempo e a tecnologia se tem encarregado de pouco a pouco fazer esmorecer na música de hoje, frequentemente limitada a dois ou três bons acordes de guitarra, ou um beat forte, ou mesmo um simples timbre poderoso "sinteticamente manipulado".



João e Bruno querem mais do que isso. São mestres cuidadosos na articulação das relações harmónicas e rítmicas entre os sons, e nas narrativas melódicas. Fazem-no com brilho e com isso enriquecem e fortalecem o seu produto musical, a ponto de conseguirem fazer sobressair o seu primeiro álbum "Parasol" (2011) no meio da avalanche de produções musicais dos nossos dias, sem deixarem o público indiferente a "mais um disco de música indie pop".

Agora, como nasceu e cresceu cada uma destas duas mentes musicais, e mais ainda, como foi que o destino se encarregou de as cruzar no espaço e no tempo (sabe-se pouco para além de que colaboraram juntos em projectos musicais anteriores à Julie), ou como é que acontecem estas músicas em estúdio, são tudo dúvidas que serão esclarecidas em primeira pessoa nas linhas que se seguem.

Quem são e de quando e de onde vêm os Julie & The Carjackers? Falem-nos um pouco da história da banda e das pessoas por detrás dos músicos João Correia e Bruno Pernadas.

Bruno Pernadas - Somos ambos músicos profissionais, nascidos e criados em Lisboa durante os Anos 80 e 90. Antes de surgir "Julie & The Carjackers" tocávamos juntos em vários grupos musicais, eu convidei o João Correia para participar em 3 projetos musicais distintos, algo entre o jazz e a música cinematográfica.
Até à época temos participado em vários projetos de outros artistas portugueses, eu como guitarrista e o João Correia como Baterista.

Quando foi e como foi que nas vossas vidas entrou a música que se viria a transformar numa carreira (de cada um)? E como é que os vossos percursos musicais se cruzaram?

Bruno Pernadas - Eu comecei a ouvir música muito cedo, devido à minha irmã mais velha, que na altura tinha muitos LP's de música pop / rock entre outras coisas, nomeadamente discos de Beatles, David Bowie, Yes, Genesis, Elis Regina, Chico Buarque, etc.

Aos 13 Anos comecei a estudar guitarra clássica, mais tarde fiz um curso profissional de Jazz na Escola do Hot Clube de Portugal e o ano passado terminei a Licenciatura de Música na Escola Superior de Música de Lisboa na Variante de Jazz. Conheci o João Correia precisamente na Escola do Hot Clube de Portugal em 2004, onde ambos estudávamos Música Jazz.

João Correia - Comecei a tocar e ouvir música através dos meus primos mais velhos. Aos 10 anos tive a minha primeira guitarra elétrica e aos 11 a minha primeira bateria. Juntamente com eles, formámos “The Fart Simpson Band” e começámos a gravar músicas originais em casa com um Fostex 4 pistas. Depois disso continuei a gravar um “disco” homemade por ano e acho que foi isso que me deu vontade de tocar vários instrumentos.

Mais tarde fiz o curso de bateria no Hot Clube de Portugal. Só em 2009, quando nasceram os Julie, é que acabei por passar da bateria para a voz e guitarra.

Passam ferias juntos? Onde gostam de ir/estar quando se juntam fora do processo criativo?

Bruno Pernadas - Normalmente não, mas como tocamos muito ao vivo em vários pontos do País, acabamos por passar muito tempo juntos também em lazer. Gostamos de estar juntos em concertos, cafés, "House Parties", jantares, praia, etc.

Qual a vossa melhor recordação juntos sem música?

Bruno Pernadas - Talvez a altura em que formámos o grupo "Julie & The Carjackers", foi num restaurante sem música.

Como se desenvolve o vosso processo criativo? Letra primeiro ou as palavras vão rolando sobre a música num ensaio?

Bruno Pernadas - Ambos fazemos as músicas em casa, eu faço umas, o João faz outras, numa segunda fase, eu faço os arranjos e o João faz as letras. Na terceira fase produzimos as músicas juntos e experimentamos várias coisas, processos, instrumentos, etc. até ficar mesmo do nosso agrado.

Julie & the Carjackers nasce como um projeto dos seus dois mentores João e Bruno. O álbum "Parasol" conta porém com uma formação mais alargada. Os Julie cresceram e são agora um Sexteto ou continua a ser um projeto do João e Bruno com músicos convidados?

Bruno Pernadas - Sim. Desde a primeira vez que tocámos ao vivo fomos sempre 6, embora a formação a nível de músicos tenha vindo a ser alterada.

João Correia – A escrita das canções e a produção no estúdio continuam a ser só dos dois. A banda ao vivo é outra história, as músicas acabam por viver da personalidade de quem as está a tocar. Os músicos que tocam connosco são-nos muito próximos. Isso faz com que ao vivo estejamos todos em sintonia. No palco não interessa quem escreveu as músicas ou quem as gravou, é de todos de igual modo.

Rock em Inglês e não Português, a eterna questão, why?

Bruno Pernadas - Porque tanto eu como o João crescemos a ouvir música cantada em Inglês, e é a língua que faz mais sentido usar na nossa música.

João Correia – A escrita de uma canção tem de ser honesta. Acho que devemos escrever as canções como elas surgem e sem filtrar e pensar demais nas coisas. Eu penso naturalmente nas letras em Inglês e não em português. Acho que sendo esse o caso, se escrevesse em português ia estar a forçar o meu processo criativo e isso nunca iria resultar.

Acho que mais importante que isso é se a letra tem história, se quer dizer algo e se chega às pessoas ou não. As palavras é que fazem a diferença e não a Língua usada para as cantar.

Consideram-se uma banda de estúdio ou de palco? O que vos dá mais gozo?

Bruno Pernadas - Eu gosto das 2, embora entre tocar para 4 pessoas num sítio minúsculo sem condições e estar no estúdio ou em casa a trabalhar, prefiro estar no estúdio.

João Correia – O que eu gosto mesmo é de escrever as músicas e gravar a primeira maqueta. A sensação de ter uma canção pronta e ligar o primeiro microfone para a gravar é o que me dá mais motivação. Acredito que é sempre a melhor música do mundo e que toda a gente vai adorar e quero gravá-la o melhor que sei. Obviamente, passados alguns minutos mudo de ideias. Mas o importante para mim é ter a ambição de fazer um bom trabalho e pensar que cada canção escrita e gravada pode durar muito tempo, independentemente do número de pessoas a que consegue chegar.

Qual (onde foi e quando) o vosso melhor concerto? E o pior? O que tiveram de especial?

Bruno Pernadas - O pior concerto foi na sala "Arte à Parte" em Coimbra, pois as condições eram más e o responsável do espaço era uma pessoa altamente desagradável e sem qualquer respeito ou consideração pelo grupo que tinha convidado.

Um dos melhores concertos que demos a nível de energia e dinâmica de grupo foi no Festival Primavera Sound 2012 no Porto.

João e Bruno, sei que levam outros projetos musicais em paralelo. Contem-nos um pouco sobre as vossas outras aventuras criativas.

Bruno Pernadas - Eu neste momento toco com vários grupos de estilos musicais diferentes, a nível de projetos pessoais tenho um 5tet de jazz onde assino como compositor/guitarrista e estou neste momento a gravar um disco a solo de música progressiva que passa por momentos de música folk, psicadélica, paisagens sonoras com bastante improvisação do qual o João está a participar como percussionista e baterista.

João Correia – Tenho tido a oportunidade de tocar com muitos artistas diferentes e tenho aprendido muito com isso. De momento, como baterista, toco com Frankie Chavez, Márcia, Walter Benjamin, Groove 4tet, Aduf, They’re Heading West , entre outros..

Muito em breve vão ser lançados os discos de “Fart Simpson Band” (passados 18 anos…) e de Saumik, outros dois projetos de originais já antigos e que vão voltar ao ativo. Tenho participado no álbum que o Bruno está a preparar e tenho também algumas canções minhas de parte mas ainda não sei o que lhes vou fazer.

Imagino que nesta altura o trabalho da banda esteja concentrado sobretudo nos espetáculos, mas para quando se pode prever um segundo álbum? Ou pelo menos se é difícil prever, se dependesse apenas da vossa vontade, para quando seria?

Bruno Pernadas - Talvez no início de 2013. Acho que é algo que ambos queremos fazer.

João Correia – Sim, no início de 2013 devemos começar a olhar para as canções de cada um e perceber o que passa e o que vamos fazer. Não podemos insistir nessa parte. Entramos em estúdio se tivermos material que gostemos mesmo muito, senão esperamos mais um pouco.

Recentemente os Rolling Stones celebraram o seu quinquagésimo aniversário, apesar de os RS terem nascido sem grandes ambições (Jagger disse um dia que a ideia era criar uma banda de rock para "gravar umas cenas" e dar uns concertos, prevendo inicialmente que como banda não durariam mais de 4 anos). Não sei o que teriam Jagger ou Richards respondido se lhes tivessem feito essa questão numa entrevista após o lançamento do primeiro disco, mas faço-a a vocês. Com toda a honestidade e paixão do caso, Bruno e João, quais são as vossas ambições e expetativas para os Julie & The Carjackers?

Bruno Pernadas - Gravar discos e dar concertos enquanto fizer sentido estarmos no projeto juntos, "no worries" and "no rush".

João Correia – Nós gostamos de escrever canções e vamos continuar a fazê-lo. Mas “no rush” e “no overthinking”. Isto é como numa relação, temos de dar o nosso melhor sem pensar no retorno, ele tem de surgir naturalmente. Se pensarmos demais as coisas não vão resultar bem. Queremos escrever canções cada vez melhores e conseguir partilhá-las com um maior número de público.

E continuando na mesma linha de raciocínio (o das perguntas difíceis, talvez?) conhecendo o famoso mito do "2º álbum", o álbum do "ou vai ou racha", o derradeiro desafio à durabilidade de um projeto musical. Depois de um tão excelente "primeiro ato", deixa-vos de alguma forma nervosos quando pensam no próximo? Alguma ideia ou curiosidade que queiram aproveitar para disseminar aqui e hoje? Ou ainda é cedo para pensar e falar do futuro?

Bruno Pernadas - O "Parasol" tem muito a favor os diferentes estilos e ambientes musicais de uma forma geral, essa é a nossa forma de escrever as músicas para este projecto, de modo que o próximo disco terá proximidades no que diz respeito a isso, portanto, desde que sejamos honestos com a nossa música, vai ser correr bem do ponto de vista de concretização.

João Correia – Não faço ideia do que vai acontecer. Estou certo que vai sair um disco honesto e isso é o mais importante.

Não somos uma banda que pense “será que os nosso fãs vão gostar disto? Será que isto é bom o suficiente?”. Isso pode acontecer a bandas que são muito conhecidas e que têm uma vasta fanbase.
Se dermos o nosso melhor e o disco for honesto, então, será um bom disco. E não há razões para não o fazermos.

Qual foi o primeiro disco que compraram (de cada um)?

Bruno Pernadas - Em Cassete; "Nevermind" - Nirvana. Em Vinyl; "BossaNova" - Pixies. Em CD; "Incesticide" - Nirvana

João Correia – O primeiro CD que comprei foi o “Arise” dos Sepultura “. Grande disco! Em cassete foi talvez dos Pantera, não me lembro bem… Vinyl não comprei porque rebentei com a aparelhagem dos meus pais a tentar tocar o “Endless Nameless” dos Nirvana com o meu primo. Depois disso passei a ouvir cassetes e CD’s num rádio tijolo manhoso…no more Vinyl for little Johnny.

Qual a vossa banda/produtor e tema preferido de sempre (internacional e Português se não forem o mesmo)?

Bruno Pernadas - Pergunta muito difícil de responder… desculpem.

João Correia: O meu produtor preferido é o Steve Albini. Música preferida…não consigo escolher.

Melhor disco de sempre (internacional e Português)?

Bruno Pernadas - Continuo sem saber muito bem o que responder… mas gosto muito do "Rain Dogs" e do "Franks Wild Years" do Tom Waits, entre outros mil discos.

João Correia – Vou apenas escolher dois discos que adoro, ok?

Escolho o “Surfer Rosa” dos Pixies porque mudou a minha vida e escolho o “Olympia” de Minta & The Brook Trout porque não ouvia um disco recente que gostasse tanto como este há algum tempo. A Francisca Cortesão e a Mariana Ricardo são incríveis.

Melhor guitarrista de sempre? (Sugere um tema)

Bruno Pernadas - Sem qualquer ordem por relevância; Jim Hall, Wes Montgomery, Django Reinhardt, Marc Ribot, Joey Santiago (Pixies)Graham Coxon (Blur), Ry Cooder, Nuno Ferreira, Mary Halverson, Bill Frisell, Xan McCurdy (Cake) et al.

João Correia – Adoro a dupla Robert Fripp e Adrian Belew na fase de King Crimson dos anos 80 mas citando a Inês Sousa, que canta connosco, “ O Bruno Pernadas toca as notas que eu quero ouvir”. Para mim é igual, Bruno Pernadas rocks!

Melhor baterista de sempre? (Sugere um tema)

Bruno Pernadas - Sem qualquer ordem por relevância; Max Roach, Paul Motian, João Correia, José Salgueiro, Elvin Jones, Ali Jackson et al.

João Correia : Humm… Tenho vários. O Dave Grohl é o meu preferido. Aprendi a tocar sozinho por cima dos discos dos Nirvana e não sosseguei até saber tudo de cor. Adoro ouvir o Chris Daddy Dave com o Robert Glasper. Quando o ouvi tocar a primeira vez fiquei louco.

O José Salgueiro tem sido uma inspiração enorme e mudou a minha maneira de pensar na bateria. Está também no topo da lista. Ouvi-o tocar há uns anos e decidi ir estudar Jazz.

Melhores vozes masculina e feminina de sempre? (Sugere um tema)

Bruno Pernadas - Sem qualquer ordem por relevância;

Masculina: Tom Waits, Nat King Cole, Brian Wilson, Noah Lennox, Johnny Hartman, Curtis Mayfield, Sam Cooke, Chico Buarque et al. Feminina: Billie Holliday, Ella Fitzgerald, Anita O' Day, Trish Keenan (Broadcast), Lhasa de la Sela, Bjork, Laititia Sadier (Stereolab), Gal Costa et al.

João Correia - A minha voz feminina preferida é a Kim Deal.
Voz masculina não sei… adoro o Stephen Malkmus.

Como é fazer música em Portugal no auge (esperemos) da crise que assola o país em pleno 2012? E lá fora seria melhor?

Bruno Pernadas - É muito complicado, pois há menos concertos e não muito bem pagos. Lá fora, com um bom Agenciamento de Concertos seria bem melhor, sim, sem dúvida.

Onde gostavam de fazer o vosso concerto em 2029 de título "Julie & The Carjackers - 20 anos a raptar a rádio dos nossos carros"? E se pudessem, quem gostariam de convidar ao palco a tocar um tema com os J&Cj?

Bruno Pernadas - No Teatro Circo em Braga, e convidar o Tom Barman dos dEUS para cantar uns temas com o João Correia.

João Correia - Gosto disso.

Qual é a melhor sala/espaço de concertos de Lisboa? E do país?

Bruno Pernadas - Em Lisboa, não sei bem, o Santiago Alquimista é um espaço muito giro para concertos, a nível técnico...

João Correia - Creio que a sala com melhores condições técnicas em que já toquei cá em Portugal foi a sala grande do Hard Club, no Porto.

Quais são o vosso local preferido em Lisboa (de noite e de dia) e qual é o o vosso canto secreto na cidade do Sol?

Bruno Pernadas - Eu gosto muito do Miradouro da Graça.

João Correia – Confesso que quando tenho algum tempo livre fujo da cidade.

Muito obrigado pelas vossas respostas, mas sobretudo pela vossa música.

Nós é que agradecemos. A Le cool é altamente!

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www.facebook.com/JulieandTheCarJackers

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