Vitória 14


Puerto López – Ecuador.

Uma cidade de pescadores bastante simpática, no coração da tão conhecida “ Ruta del Sol”. Depois de uma longa viagem noturna desde Guayaquill, aqui eu e o Diogo encontramos um paraíso perdido. Abrimos o guia de viagem que apenas usamos para procurar alojamento, e entramos no “ Hostel Sol Inn”. E daqui não queremos sair mais. Um hostel construído de bambu, com uma zona chill out, uma cozinha aberta, imensas plantas tropicais, e o quarto - um sonho. Tudo por apenas 20 dólares a noite. Era o local ideal para terminarmos esta viagem juntos.




A senhora da recepção assim que soube de onde éramos, fez um sorriso de orelha a orelha dizendo que tinha boas recordações de hóspedes portugueses. Instalamo-nos, apanhamos um mototáxi, e vamos aos “Los Frailles” onde se encontra uma das praias mais virgens da América do Sul, e mais paradisíacas, tanto que foi considerada uma reserva natural – “ Parque Machalilla” - onde existe um horário de entrada e saída.

E o mito confirma-se. Dias depois fomos a uma comunidade de indígenas – “Comunidad Agua Blanca” - a poucos kilómetros do centro da cidade, onde visitámos um Museu, e onde desfrutámos de uns super relaxantes banhos de lama. Puerto López é conhecido pelo avistamento do acasalamento das baleias jorobadas entre junho e outubro, e é também onde se encontra a “ Isla de la Plata”, conhecida como a Galápagos dos pobres, para quem não pode pagar uma viagem às verdadeiras Ilhas Galápagos. Mas devido às chuvas torrenciais dos últimos dias, apenas tivemos oportunidade de ir à Ilha Salango, onde também existem algumas espécies semelhantes como o albatroz de pata azul, tão característicos dessa zona.

Eu e o Diogo tomávamos o pequeno-almoço num simpático restaurante, com o pé na areia e ao jantar um riquíssimo camarão com leite de coco. Foram curtos os dias nesta pequena cidade, mas voltaria de certeza.

As paisagens dão-me um pouco a ideia de como será a Ásia, especialmente as praias na Tailândia e Indonésia. A boa vida acaba e eu tenho que regressar a Trujillo – Peru para voar de volta a Cusco, e o Diogo tem de seguir viagem ao norte! Foi um prazer viajar com ele, e recordar muitas histórias do nosso “tugal”, e partilhar momentos com alguém que tal como eu, conhece os detalhes e a magia do que é viver na América do Sul.

Ollantaytambo, Peru. De volta à Cidade Viva dos Incas. Começo a trabalhar numa Associação – Yachay Wasi - da qual pertencem dois tipos de projetos : um jardim de infância – do qual sou coordenadora e professora e uma biblioteca – Telecentro, onde dou aulas de costura e expressão dramática.

A coisa vai bem, até que os locais depois de sermos a primeira ONG a dar apoio à educação nos últimos 3 anos, às crianças de Ollantaytambo, decidem expulsar-nos do espaço do Telecentro apenas porque somos “gringos”. Fomos vítimas de xenofobia, e quando conseguimos chegar com esta informação aos “media”, pensando que teríamos uma oportunidade para nos expressarmos, quando lemos a notícia, tudo o que declarámos foi deturpado e dando vantagem às autoridades locais.

Os dias passam e os Ollantinos fazem de tudo para com que tudo o que é estrangeiro vá embora daqui para fora. Quando na realidade, as ONGs que roubam mais dinheiro neste povo, são organizadas pelos próprios Ollantinos. A nós expulsam-nos, a mim as vítimas das inundações depois de um ano e meio desde que dou o meu tempo e dedicação a apoiá-los, como ainda não viram o dinheiro que angariei para irem gastar em “chicha”, porque no final do dia não querem saber de tijolos, cimento ou ferramentas para construírem as suas casas, porque pensam que é fácil organizar um projeto de reconstrução para 20 famílias e como querem tudo de mão beijada, porque sou “gringa” e é essa a minha obrigação, decidiram colocar uma denúncia em meu nome e no do Celestino, alegando que estávamos a fazer um esquema para ficarmos com o dinheiro. Eu nem queria acreditar no que estava a ouvir, quando a rádio de Urubamba entrou em contacto comigo dizendo isso.

Com o stress, de um lado e de outro, a minha saúde começou a dar sinais de que eu não estava bem. E mais tarde foi o que se confirmou. Decidi parar e ter um tempo para mim, e tentar encontrar respostas. Apercebi– me que não voltaria atrás, que tudo são aprendizagens, e que tudo passa por um motivo. Nessa semana tive uma curandeira a ajudar-me com umas plantas, onde também me leu as folhas da coca e começou a entrar em transe em “quechua”. Disse que o motivo pelo qual eu estava cá, era porque vinha ao reencontro dos meus antepassados, ao qual eu pertenci à nobreza inca, e fui uma princesa inca. Não sei se acredito, mas já há muitos que me dizem o mesmo.

Apercebi-me que está na hora de fechar uns ciclos e abrir outros. E decidi começar pouco a pouco. Com as vítimas de Urubamba, decidi comunicar a quem doou o dinheiro para decidirem afinal que destino queriam ao seu dinheiro e encontro-me nesse processo.

Quanto a Yachay Wasi, continuamos com o jardim, mas o projeto do Telecentro temos de ver que futuro terá, se terá aqui ou noutro lugar. Estamos todos tão cansados de tentar ajudar os locais, e todos os dias em pequenos momentos do dia a dia a única coisa que te sabem fazer é roubar, ou falar mal de ti assim que viras costas, porque vens de fora. Depois de um ataque de nervos e de demasiado stress, para a minha sanidade física e mental, decidi despedir-me temporariamente do meu trabalho. A minha relação que durou 6 meses também chegou ao fim. Foi bom enquanto durou, mas não é o que necessito para este momento da minha vida.

E finalmente tenho a minha casa. Depois de tantos meses de espera, tenho aquilo exatamente que queria. Foi duro, porque jamais que parecia que ia acontecer, e agora tenho uma casa linda no meio das montanhas, com vista para as ruínas, onde todas as noites me sento lá fora, e oiço o rio a correr, e vejo o céu estrelado, a chover de estrelas cadentes a 3000 metros de altura, num silêncio que por tanto esperei. O povo onde estou chama–se PukaRumi (Pedra Vermelha em “quechua”), caminhando 20 minutos fora de Ollantaytambo, com dois andares, uma quinta enorme, um cão, dois gatos, uma vida de campo tal qual como queria.

Assim que os meus planos, mudaram de alguma forma. Os dois anos que tinha em mente de aqui ficar, já estão fora de questão. O meu documentário? Também. Será para outra altura, para outro lugar, talvez até nem tenha que existir. A ideia é ficar aqui até dezembro, viajar dois meses para a Ásia ou Índia, voltar, comprar uma carrinha, meter o meu cão lá dentro e subir tudo até ao México, e parar onde sentir que tenho de parar. Soa um bom plano, mas tudo pode mudar a qualquer momento, e essa é a parte que mais me dá tesão de viver.

Quero agradecer a todos que até agora me apoiaram com o projecto das vítimas das cheias. E que saibam que nada é em vão.

E agora, o próximo passo? Portugal. Com um bilhete na mão que diz Buenos Aires – Lisboa.

Paqarinkama!!! ( Até amanhã, em “quechua” )

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